O ULTRATRAIL NÃO ESTÁ À VENDA
Não tenho nada contra a introdução de prémios monetários no UltraTrail. A palavra-chave aqui é «Ultra». Ao contrário de muitos, penso que o dinheiro nas Ultras não terá o efeito negativo de que por aí se fala. Poderá tê-lo nas provas mais curtas, visto que na sua essência são encaradas como provas de atletismo. Quanto às Ultras, podem estar certos e certinhos de que elas não perderão o seu encanto por um punhado de euros. Com o dinheiro haverá menos camaradagem, menos fair-play e menos respeito pela natureza? Não sei nem me interessa, pois não é isso que nos atrai nas Ultras. O que nos atrai nas Ultras é a superação – e a superação não se compra. Conquista-se. É a superação que conta. Tudo o resto – o companheirismo, o divertimento e a natureza – vem por arrasto.
Exemplo prático: no passado fim-de-semana realizou-se o MIUT e o Trail de Miranda do Douro (TMD). De um lado, uma prova de créditos firmados, que para muitos implica um elevado custo financeiro (por se realizar na Madeira) e sem prémios monetários. Do outro, uma primeira edição, realizada no Continente e com prémios monetários. Agora vejam o feedback dos atletas e o número de participantes numa prova e na outra.
O MIUT deixou todos rendidos. O TMD deixou muitos desiludidos. O TMD começou com 45min de atraso porque estava nevoeiro. Repito: porque estava nevoeiro. Havia estacas de madeira e cordéis de atar chouriças a fazer as vezes de fitas de sinalização. Havia pontos em que os atletas de diferentes provas se cruzavam, vindos de diferentes direcções, uns com 12km, outros com 20km e outros 28km. Apenas 10 atletas fizeram o percurso correcto porque nos primeiros 200m havia uma cortada à esquerda e placas à direita – e quase todos seguiram as placas. E não houve classificação feminina porque nenhuma mulher se encontrava entre os 10 atletas referidos anteriormente. Um desastre.
Em boa verdade, eu aplaudo a introdução de prémios monetários no Trail. Os nossos campeões merecem o dinheiro. Mais do que merecem, precisam. Mas que país é este no qual os seus melhores atletas andam rotos? O André Rodrigues, por exemplo, parece um sem-abrigo atropelado por uma debulhadora. O desgraçado anda na rua e as pessoas dão-lhe dinheiro para ele comprar umas sapatilhas novas. Assim não pode ser.